Além de belas praias, Catalunha francesa atrai turistas com vilas medievais e boa gastronomia

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Cidade de Perpignan foi chamada por Salvador Dalí de “centro do mundo”; região é opção para famílias e até para quem gosta de esportes radicais.

Nem Oriente Médio nem Ásia, muito menos África: o verdadeiro berço da civilização seria a pequena cidade de Perpignan, no sul da França. Pelo menos era essa a convicção do pintor espanhol Salvador Dalí, que não hesitava em chamar a cidade francesa, e mais precisamente a estação ferroviária dela, de “centro do mundo” sempre que tinha oportunidade. “Sem Perpignan estaríamos hoje na Austrália, provavelmente cercados de cangurus”, disse o pintor em entrevista à televisão francesa em 1978.

Surrealista como toda sua obra, a afirmação, no entanto, teria certa lógica. “No momento em que o golfo da Biscaia foi formado durante a famosa deriva dos continentes, apenas Perpignan resistiu. Se não fosse por isto não estaríamos mais aqui”, explicou. Dalí imaginava que se não fosse a resistência da pequena cidade, a 30 km da fronteira com a Espanha, a Península Ibérica estaria provavelmente flutuando em algum lugar no Pacífico, separada do restante da Europa.

Perpignan faz parte da chamada Catalunha Francesa ou Catalunha Norte, território cedido pela coroa espanhola à França em 1659 por tratado, mas que guardou tradições da cultura catalã. Os limites da influência cultural são difíceis de serem determinados com precisão, mas geralmente a região é representada pelo atual departamento dos Pirineus Orientais, que se extende desde o mar Mediterrâneo até os Pirineus. A proximidade tanto das praias, quanto das montanhas é uma enorme vantagem, pois consegue atrair um público variado em diferentes períodos do ano. E a boa mesa catalã só acumula mais motivos para visitar o local.

Collioure_praia

Há diversas opções de transporte para chegar à região, dependendo do ponto de partida. De Paris, a viagem de trem demora cerca de 5h até a estação de Perpignan e, de Londres, a companhia aérea low cost Ryanair faz a conexão por preços imbatíveis. Barcelona é a metrópole mais próxima da Catalunha Norte e a viagem de carro demora apenas 2h – ou um pouco mais, caso o motorista prefira evitar as grandes rodovias e ir beirando a costa para apreciar a paisagem.

A cidade de Perpignan, em si, não tem muitos atrativos, por isso o ideal é chegar e não perder muito tempo. A melhor maneira de explorar a região é alugar um carro e ir parando quando der na telha. O sul da França é cheio de charmosos vilarejos que muitas vezes nem estão no mapa e é ótimo ter a liberdade de fazer uma pausa para almoçar em um deles, por exemplo.

Costas Vermella e Ametista

O litoral da Catalunha Francesa não é tão badalado quanto a Côte d’Azur, por isso é uma boa opção para quem prefere fazer uma viagem tranquila e mais em conta. A maior parte dos turistas da região são os próprios franceses vindos de diversas cidades do país, quase sempre de carro. Os ingleses também parecem apreciar as praias da região e às vezes ouvem-se grupos falando alemão. As famílias são numerosas e as crianças estão por todo lado. É um destino turístico bem familiar, perfeito para quem prefere evitar grupos barulhentos.

A costa dos Pirineus Orientais é dividida em duas partes: a Ametista e a Vermella. A primeira, mais ao norte, ocupa a maior parte do litoral e é praticamente uma única praia de 40 quilômetros de extensão que vai desde Le Barcarès até Argelès-sur-Mer. As cidades praianas mudam completamente de acordo com a estação: no inverno ficam vazias e poucos comércios permanecem abertos, mas no verão recebem milhares de visitantes ao mesmo tempo. Para evitar a alta temporada, o melhor é ir nos meses de junho ou setembro e evitar julho e agosto, pico do verão europeu.

Os turistas se hospedam em hoteis e apartamentos alugados por temporada, mas principalmente nos campings espalhados nos arredores das cidades. Os campings são praticamente uma instituição na região, talvez a maior concentração do país. Cada um é classificado com estrelas de acordo com as comodidades que oferecem, que varia entre piscinas com toboágua, minigolfe, animadores contratados e ótimos restaurantes. As famílias se instalam com trailers de viagem e só vão embora no final das férias.

Nesta parte da costa há muito vento, interessante para os adeptos de esportes náuticos como windsurf ou vela. Diversas empresas oferecem aulas e aluguel de equipamentos: cinco dias de curso de windsurf custam cerca de 120 euros por pessoa.

Vilarejo de Villefranche-de-Conflent, de onde sai o Train Jaune (Trem Amarelo)
Vilarejo de Villefranche-de-Conflent, de onde sai o Train Jaune (Trem Amarelo)

Côte Vermeille (Costa Vermelha), que começa no sul de Argèles e termina em Port-Bou, fronteira com a Espanha, é a parte mais charmosa da região. A cidade de Collioure é provavelmente a mais bela do litoral da Catalunha Francesa, com seu castelo beirando o mar e uma vista para um moinho no topo da colina. A praia em si é pequena, mas há diversos outros centros de interesse na cidade, como as ruelas com fachadas coloridas.

Banyuls-sur-mer e Port-Vendres são outras cidades que valem a visita, nem que seja para contemplar a vista do passeio de carro entre elas. Mergulhadores profissionais e amadores costumam apreciar as águas cristalinas da Costa Vermelha. A visibilidade geralmente é boa e há muitos centros de mergulho no local.

Patrimônio cultural

Vista dos Pirineus, na região da Catalunha francesa
Vista dos Pirineus, na região da Catalunha francesa

A gastronomia dos Pirineus Orientais segue o padrão mediterrâneo: peixes e frutos do mar acompanhados de molhos como rouille ou aioli, charcuterie tradicional, tapas e linguiças típicas grelhadas. A área também é grande produtora de frutas e legumes mediterrâneos: basta uma parada na feira para perceber que os tomates, por exemplo, têm muito mais sabor.

Os vinhos produzidos no local são tradicionalmente mais doces, como o Banyuls, o Rivesaltes e o Muscat. O vinho rosé, além do branco e do tinto, tem seu lugar garantido em todas as adegas. Comprando direto com os produtores ou em cooperativas, é possível encontrar bons vinhos por pouco mais de um euro o litro, vendidos diretamente de barris. É recomendável levar a própria garrafa.

Adentrando o interior da Catalunha Norte, há vilarejos que valem a visita, como Castelnou. Fundada no século 14, a cidadezinha nunca ultrapassou os 500 habitantes e mesmo assim é considerada uma das mais bonitas da França. Um pouco mais longe, a 20 quilômetros de Perpignan, está a impressionante Forteresse de Salses (Forte de Salses), construída por Fernando de Aragão e Isabel de Castela há mais de 500 anos. A fortaleza guardava a antiga fronteira entre a França e a Catalunha. A visita ao castelo custa 7,50 euros por pessoa.

Mais ao norte é possível encontrar alguns castelos cátares, que serviam de refúgio para os “bons cristãos”, como eram conhecidos os adeptos do catarismo na idade média. A crença cátara era baseada no cristianismo, porém oposta à igreja católica, que começou a perder fieis para a nova corrente. Por essa razão, autoridades católicas passaram a perseguir e matar os cátares. Os castelos fortificados não foram suficientes para impedir a completa extinção. Os dois mais próximos da Catalunha Francesa são o Château de Quéribus e o Château de Peyrepertuse.

Para os amadores de montanha, há infinitas trilhas para explorar na região. Uma boa opção é começar o passeio com o Train Jaune (Trem Amarelo), que liga as estações Villefranche-de-Conflent e Letour de Carol. É um percuso turístico de 63 km que passa por 19 túneis e duas pontes. A linha funciona o ano todo e para em 22 estações diferentes. O ideal é ir até Font-Romeu, lá escolher uma das trilhas e fazer um passeio a pé nas inúmeras lagoas do Parque Naturel Regional des Pyrenées Catalanes. No inverno o local se transforma em uma enorme estação de esqui.

Salvador Dalí pode ter divagado demais e a Catalunha Francesa não seja o centro do mundo, mas com certeza é um pedacinho dele que merece ser visitado.

Trilha em Gorges de la Carança, que começa em uma das paradas do Train Jeune
Trilha em Gorges de la Carança, que começa em uma das paradas do Train Jeune

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